quarta-feira, 27 de abril de 2011

FACA FOICE / FOICE FACA

Fosse foice
Fosse fácil fosse farto
Fosse faca

Fosse falha
Fosse um coice
Feito a foice

Fosse um corte
Forte fosse
Feito à faca

Ninguém se importou
E aquele menino impuro
Cresceu impuro
Sofreu impuro
E quando todos se distraíram:
“Olha o menino aí na sua frente!”

Ceifa a foice
Ceifa fere a folha fleuma
Feito faca

Face a face
Falha o fino fio da faca
Feito foice

Faca foice
Feia face afia a foice
Afia a faca

Ele caminhou pelas ruas abandonadas
Abandonado
De madrugada
Não comeu o pão que o diabo amassou
– Não houve tempo –
Mas havia uma certeza
Quando criança aprendera a sonhar
Com um mundo melhor

Fogo-fátuo
Fere ferve inflama a flora
E foge a fauna


Fingem não ver
O que deles vai à frente
Face a face
Foice a foice
Faca a faca
Com olhos fundos
Olhar profundo
Sem destino
Sem tempo
Nem lugar

No choice
No chance
No change
No more lost life

Fosse à foice
Fosse à faca
Fóssil fosse
Franco e fraco
Forte e farto

Fosse faca
Fosse foice
Foice faca
Faca foice

Faca fosse
Foice fosse
Fosse o fim

Do fim enfim.

(In: Versorragia Verborrágica - 2006/2011)



sábado, 23 de abril de 2011

FOTOS & CARTAS


Vou arrumar as gavetas e jogar fora
O que já não me diz respeito
O que não tem tanta importância
Não quero me prender ao passado.
A vida é cheia de lembranças boas e más
Eu já não aguento mais
O que é que eu posso fazer
Pra me livrar de nós?

Fotos e cartas
Lembranças boas e más
Eu já não aguento mais
E o que é que eu posso fazer
Pra me livrar de nós?
O que é que eu faço
Pra me livrar de mim?
E o que é que eu vou fazer
Pra me livrar de você?

(letra: Vôgaluz Miranda/ música: Wagner Miranda - 1995) 



quinta-feira, 21 de abril de 2011

DOS SORRISOS

Há mistérios ocultos nos sorrisos,
uns mostram alegria com firmeza,
outros, no entanto, frágeis e imprecisos,
definitivos traços de tristeza.
 
São os sorrisos largos e expansivos
satisfação repleta e garantida,
enquanto os melancólicos remidos,
condição da pureza pervertida.

Os sorrisos prescindem das razões,
traições, ilusões, ressentimentos,
estão até nos trágicos momentos
em que de nada valem as canções.

Os sorrisos contemplam a esperança,
de tímidos, de plácidos se fazem,
os sorrisos discretos são mensagens,
mas os sinceros nascem nas crianças.
 
- Que Deus proteja todas as crianças!

(In: O Perfume do Tempo - 2004/2005)


 

sábado, 16 de abril de 2011

O JANTAR


Sobre a mesa, talheres e... um pouco do meu destino.
Flores enfeitam a sala de jantar e envolvem o meu corpo.
Minha companhia esta noite: a solidão,
Talvez eu diga a ela o que aprendi sobre o amor,
Embora eu saiba que o amor está longe,
Longe demais agora.

E cearei comigo à luz de velas,
Porque terei somente o brilho delas.

No final, quem sabe, com um brinde discreto,
Velhas canções e a forte lembrança de uma época feliz e distante,
Na qual vivi momentos que deixaram marcas para sempre,
Eu chore ao ver que do outro lado da mesa,
Tranquila e ordinária,
Uma cadeira vazia ainda espera.

(In: O Perfume do Tempo - 2004/2005)

Obs.: Este poema foi publicado no livro "Coletânea de Poesias Melhor da Web" (Usina de Letras) lançado na Bienal do Livro do Rio de Janeiro em setembro de 2009.


 

ELA & ELA


Ela ficou deitada
Enquanto ela foi trabalhar
Enquanto ela ficou em casa
Ela foi viajar.

Ela se referiu à tarde
Como se visse um barco partindo
Desaparecendo em alto mar
Carregado de paz
Carregado de amor pra dar.

Ela pintou o retrato de um amor
Com todas as cores da aquarela
E conseguiu expressar tanta dignidade
No rosto que era só dela.

Quem condenará
Alguém que saiba amar?

Ela ama Ela ama Ela ama Ela ama...

De repente, um beijo, um gesto,
Um pedaço de papel que dura uma vida inteira.
E já não é mais igual,
É tão natural
É da mesma maneira.

Quem condenará?
Quem?

(In: Versorragia Verborrágica - 2006/2011)


 

HAICAI DO SOL

O dia raiou,
um mundo novo virá,
depende de mim.

(In: O Perfume do Tempo - 2004/2005)



O AMOR MORREU


O amor morreu
e me prendeu
dentro de ti.


A dor é forte
só não se pode
ficar assim,


abandonado,
desencantado,
chegando ao fim.


As flores mortas
são tristes rosas
no meu jardim.


O amor morreu
e se escondeu
dentro de mim.

(In: O Perfume do Tempo - 2004/2005)


 

quarta-feira, 13 de abril de 2011

MENINA


Menina,
Quem foi que te disse que o mundo era colorido?
Quem te encheu a cabeça com esse papo
De casa, filhos, família...

Quem, menina?
Alguém, menina?

À noite enquanto todos dormiam
Sonhavas de olhos abertos
Flores
Sabores
Amores
Algum tempero para uma alma irrequieta
E no espelho...
Rosto de boneca.

Quem te levou ao céu, menina,
Não está mais aqui.
O anjo que te encantou se perdeu no inferno
Com uma diabinha.

Quem, Alguém?
Alguém, Quem?

Um pássaro fugaz
Um presente na gaveta
Um futuro pela frente
E um coração em pedaços.

Menina,
Quem disse que o amor não dói?


(In: Versorragia Verborrágica - 2006/2011)

domingo, 10 de abril de 2011

ESQUEZIDOS

No cume do lixo farto
Vi um menino pelado
Imundo... desencantado...
Sem dor... amor... sem olfato
Infância com cheiro de alho
De gosto podre estragado
Triste estupro ignorado
Da mãe de corpo marcado

O povo sobe aos telhados
Atrás da vida de fato
De casas com cadeados
Sonhos de um mundo isolado
Ali nenhum candidato
Presidente ou deputado
Sente o gosto salgado
Vidas deixadas de lado

Marcam o passo apressado
Os pés que sujos de barro
E chinelos remendados
Desprovidos de sapatos
Voltam-se para o passado
Janela e muro quadrados
Pintura em quadro mofado
Destino sempre roubado

Corre... menino assustado
Quem sabe a cor do pecado?
Falta feijão no teu prato
Que é sempre quem paga o pato
Qual homem civilizado
Aguenta o peso do fardo
Cume do lixo lançado
Nas vidas postas de lado?
 
(In: Versorragia Verborrágica - 2006/2011)


 

sábado, 9 de abril de 2011

VIDA E POESIA

“Para que serve a poesia, poeta?”
– Para nada, saco! – respondo curto, justo e grosso.
Justo? Não sei, não sei.
Eis aí o contrassenso.
Assim talvez não deva ser.
Passo, então, a me explicar com outra pergunta:
– E a vida para que serve, hein?
Instintivamente, em resposta, me dirão:
“Poeta, não seja ingênuo. A vida serve para ser vivida.”
Ah! Então é isso.
Com o tempo percebi que a vida e a poesia caminham juntas.
Estão sempre unidas... incansáveis.
Para mim a poesia serve para ser vivida
E a vida para ser poetizada.

 (In: Versorragia Verborrágica - 2011)



 

CANTAREI OUTRA CANÇÃO (letra música)

Recebo em teu sorriso
tudo o que é preciso na minha vida
e amanhã, quem sabe, cantarei outra canção.

A maldade não existe
se tua alegria me divide em mil estrelas
e amanhã, quem sabe, te darei meu coração.

A vida inteira eu quero te amar e ser feliz
não quero me esquecer de tudo o que eu quis.
O mundo está insano, mas dá pra resistir,
a tua fragilidade me dá forças pra existir.

E amanhã, quem sabe, cantarei outra canção.

Quero ver nascer o sonho,
de um olhor meigo e tristonho, o peito palpita.
E amanhã, quem sabe, cantarei outra canção.

E amanhã, quem sabe, te darei meu coração.
E amanhã, quem sabe, morrerei de solidão.
E amanhã, quem sabe, cantarei outra canção.

(Letra de música 1995)



 

quarta-feira, 6 de abril de 2011

TRÊS HAICAIS (Amor)

A noite acabou
Nasce o sol no coração
De quem sabe amar.




É carta de amor
Transportada pelo vento
O pólen da flor.




Adormece a lua
Nos braços fortes da noite
Cansada de (tanto) amar.


(In: Versorragia Verborrágica - 2006/2011)



DESPEDIDA


Agoniza serenamente a tua face pálida,
Transpira lágrimas tua pele cálida.
Teu corpo me diz: - Adeus.
Teu corpo me diz: - Adeus.

Silêncio perene (melhor acalento).
No entanto, da triste janela vejo
a vida que rege o mundo lá fora.

E me perco.
E te perco no eterno jogo das horas,
há tempos não sei sorrir,
a dor que secou teu riso
deixou cicatrizes no meu.
Tive medo de te perder,
mas agora não sei o que é ganhar.
O fim parece inevitável.
Teu rosto me diz: - Adeus.
Teus olhos dizem: - Adeus.

Seguro as tuas mãos frias de quase sem vida,
mãos que um dia tocaram-me a face
- sentimento caroável inesquecível -
e que, por ora, mal sentem as minhas.

Tuas mãos me dizem: - Adeus.
Tuas mãos: - Adeus.

Ouço batidas na porta.
Abro-a.
Mesmo que eu não quisesse,
entra no quarto o misterioso anjo, aquele que por duas vezes
abraçou Lázaro.
E o anjo macabro, infatigável e infalível,
caminhou até o teu leito,
tomou-te nos braços,
afagou-te o rosto sofrido e moribundo,
olhou-te nos olhos e riu um riso triste.
O riso mais triste que já se viu.

E da janela vejo
que a vida ainda rege o mundo lá fora.
Vejo pela última vez uma luz iluminar-te o semblante.
E o fim da tua dor.
E o fim dos nossos dias.
E o fim da nossa história.
Minha agonia começou
quando tua alma me disse: - Adeus.




(In: O Perfume do Tempo - 2004/2005)



domingo, 3 de abril de 2011

TRÊS TROVAS DO CORAÇÃO

Se o coração é de ferro
E mesmo assim se enamora
Vê na ferrugem remédio
Quando um amor vai embora.



Pro coração vagabundo
Toda aventura é amor
Todo amor um absurdo
De fingimento e de dor.



Se um coração de madeira
Jamais quiser perdoar
Resta no fundo a certeza:
Não aprendeu a amar.



(In: Versorragia Verborrágica - 2006/2011)




CABEÇA

Cabeça
 pele, carne e pêlos,
limites extremo... cabelos,
parte de cima do pescoço
suspensa no ar, caixa marfim de osso.
Cheia de sufoco, pressão dos  pensamentos.
Fecham-se os olhos e ela vê tudo o que não se  vê.
Abrem-se bocas molhadas, salivas salgadas,
sabores esquisitos adormecem línguas,
queixos, dentes, cáries, gripes e males;
culpas, remorsos, tédio e dúvidas salutares.
Visões de um mundo redonda cabeça,
umbrais de pedra sólida e sem cura,
circos aonde os sangues e vinhos
circulam fluindo tempestivos
pelos destinos atrevidos
enquanto morrem nas veias
encharcadas do
coração

 (In; O Perfume do Tempo - 2004/2005) 


 

REFLEXÃO III

Meus dedos correm pelo papel
como o meu sangue pelos meus braços
e sonhos saem em tortos traços
na amarga vida de doce fel.


Se no papel eternizo a tinta,
vou constuindo em tudo mistérios,
transformo assuntos, quem sabe, sérios,
em fatos bestas da minha vida.


E passo o dia na dor imerso
e traz a noite toda tristeza,
se alguém declama com mais frieza,
não faço guerra, só faço versos.

(In: Perfume do Tempo - 2004/2005)


 

REFLEXÃO I

Escrevo as coisas da vida,
enquanto a vida me escreve
estória boba e comprida
que não se cumpre, se atreve
a verdades e mentiras
que a gente logo se esquece
encontros e despedidas
marcantes por serem breves.

Folha seca solta ao vento
entregue ao próprio destino,
falta-me o teu acalento,
mas sobrevivo tranquilo,
não acredito que o tempo
destrua em mim o menino
que segue sempre fazendo
o que acha belo e divino.

Ao porto volta o navio
e eu fujo da tempestade,
aceito por desafio
que o mar imenso me farte
de novidades sem brio
por erro chamadas de arte,
perdoem-me o desvario,
bobagens de minha parte.

(In: O Perfume do Tempo - 2004/2005)


sábado, 2 de abril de 2011

VENTO


              Acabou como uma luz que se apagou
              no limiar da noite não restou nem o amor.
              Vento leva, leva vento, leva . . .
              
              Mãos frias espalmadas sobre a mesa
              guardam, antes que certeza, tristeza.
              Leva vento, vento leva, leva . . .
              
              Sólida e tragicamente, dois corações
              armazenaram tantas emoções.
              Leve o vento leva, leva leve vento, leva . . .
              
              Cortinas empoeiradas escondem o passado
              com receio do que é belo, tosco e rebuscado.
              Vento leva, leva vento, leva . . .
              
              Vento me leva, me leva vento, me leva . . .


(In: O Perfume do Tempo - 2004/2005)



 

QUEM COMEU MEU MAMÃO?














Será que foi o homem,
o pedreiro,
ou o  presidente?
Um visitante que esteve presente?
A geladeira,
a pia,
o fogão?
Quem comeu o meu mamão?

Foi a mulher
ou alguém da ONU ?
Um extraterrestre, um ser humano?
Foi um gay?
- Não sei.
Foi um cupido?
- Duvido.
Onde está a resposta,
a verdade e a solução?
Quem comeu o meu mamão?

Foi o cachorro?
O jabuti?
Foram seus olhos?
- Eu não os vi.
Foi o pintor, não foi?
Foi uma cabra, um boi
ou alguém no Japão
que comeu meu mamão?


Perguntem à NASA,
ao Vaticano, ao Papa,
meu pai e ao Pai.
Intimem-se
o meu avô, meu filho
e irmão.
Quem comeu o meu mamão?

Com letras neon
Escritas na lua,
no baixo Leblon
com faixa na rua.

Einstein que diga.
Freud, explica!!!
Quem comeu o meu mamão?
Ei, Sócrates!
Ei, ei, Platão!
Quem comeu o meu mamão?

Você sabe?
- Sei, não.

 (In: O Perfume do Tempo - 2004/2005)



CAMINHO DA ROÇA


O galo canta cedinho,
         madrugada preguiçosa,
o leite ferve no bule,
         leite da vaca mimosa,
não há quem não se estimule
         a levantar de mansinho
com o barulho na choça.


Bolo de fubá na mesa,
         tem manteiga de garrafa,
cheiro de café pelo ar
        e pão com trigo da safra,
pássaros põem-se a cantar,
        partimos com a clareza,
doce caminho da roça.


(In: O Perfume do Tempo - 2004/2005) 




PESCADOR


O mar,
mestre dos navegantes,
berço dos romances,
começo e fim de grandes amores,
guardião do farol solitário,
tem a cor imprecisa dos teus olhos
e o estranho brilho da tua pele
morena.

Ah! O mar me traz tantas saudades.
Ah! O mar, o eterno mar.

Teu riso infantil me dizia
o quanto querias
ser minha... no mar.
Dois corpos nus rolaram na areia
tendo a noite por testemunha,
e o mar, que se uniu a nós,
esconde o sol,
as estrelas do céu,
e afoga as paixões sem piedade.

Ah! O mar, o imenso mar.
Mar que me mata devagar.

O mar,
casa dos marinheiros,
rota dos barcos de pesca,
lar dos pescadores,
amante de Iara,
tem a cor indefinida dos teus olhos
e o mistério dos teus cabelos
molhados.


O mar
cujas ondas me tocam a alma,
é o mesmo mar que esconde os afogados.
O mar levou o meu coração para longe
e me aprisionou em ilhas distantes,
ilha da Ilusão,
ilha da Saudade,
ilha do Amor,
e todas estas ilhas... distantes de ti,
meu amor,
e dos teus olhos
indiferente cor do amar.

Quanta saudade eu tenho do mar.
Ah! O mar foi feito para os lunáticos.

O mar,
velho contador de histórias,
numa noite escura e fria,
veio até mim e revelou
onde escondeu o meu amor.
Então, eu caminhei pela praia,
enfrentei as ondas,
entrei nas águas
e fui buscar o teu coração, morena,
melancolicamente,
no fundo do mar.

(In: O Perfume do Tempo - 2004/2005)


 

FACA


           A faca corta o queijo
que vai à minha boca,
           a boca rouba um beijo
numa alegria louca,


           louca alegria solta
envolta num lampejo,
           escuta quase mouca
que a boca rouba um beijo,


           que rouba um beijo a boca
e explode de desejo,
           tão dura e quase louca
a faca corta o queijo.


(In: O Perfume do Tempo - 2004/2005)