domingo, 29 de janeiro de 2012

FOUR LITTLE BIRDS


O primeiro passarinho
Pousou no galho da mangueira,
Voou por entre as árvores do bosque
E se perdeu de vista.

O segundo passarinho
Caiu trucidado.
Estúpida pedra
Maldito estilingue.

O terceiro passarinho
Pousou na minha mão,
Depois no meu ombro
E uma nova mensagem
Soprou no meu ouvido.

O quarto passarinho
Jamais
Apareceu.


(In: Versorragia Verborrágica - 2006/2011)

sábado, 21 de janeiro de 2012

SÃO PAULO

 Nota do poeta: Este poema foi escrito em 2004, recentemente (07/01/2012) eu tive a honra de apresentá-lo no Sarau "A Plenos Pulmões" da "Casa das Rosas". Para mim, declamar este poema, cuja intenção é de apenas prestar uma homenagem a esta cidade brasileira extremamente problemática e complexa, mas ao mesmo tempo fascinante, foi uma experiência incrível. Declamar São Paulo em plena Avenida Paulista teve um gosto especial. Abraços ao poeta Marco Pezão, que com simpatia e carisma conduz tão bem o Sarau "A Plenos Pulmões". São Paulo, parabéns por mais um aniversário. Saudações a todos, Vôgaluz. 
São Paulo
que jamais espera.
São Paulo
que nunca se entrega.
São Paulo,
cidade de sonhos.
São Paulo,
frágeis e medonhos.
São Paulo,
não me desanime.
São Paulo
que não se define.
São Paulo,
sigo o teu destino.
São Paulo,
faça-me menino.


Cidade de ferro,
de concreto e aço,
nada de mais belo
há no teu espaço
que o teu homem moço,
que o teu velho triste,
neste ledo esboço
nada mais existe.
E formosa segues
pelas sujas ruas
de cuidados breves,
e as cabeças nuas
do povo que ferve
no teu clima louco,
mas ninguém se atreve
a perder teu jogo.
És locomotiva
do país febril,
bem pouco atrativa,
natureza ardil,
amo-te São Paulo,
cidade teimosa,
corro os teus asfaltos
na luta engenhosa.


São Paulo,
trem de Adoniram.
São Paulo,
muita fé pagã.
São Paulo
de Mário de Andrade.
São Paulo,
qual a tua idade?
São Paulo
do Ibirapuera.
São Paulo,
filhos de quimeras.
São Paulo,
Lapa e Liberdade.
São Paulo
de Oswald de Andrade.


Cidade onde tudo
é força motriz,
não colhes do fruto,
preferes raiz,
o teu destempero
merece atenção,
caminhas no peito
da população.
Exalas paixão,
cidade aclamada,
em cada estação
há filas paradas,
no teu pobre esbulho
de fé verdadeira,
demonstras orgulho
de ser brasileira.
Princesinha eclética,
cidade difícil,
construção poética
dos teus edifícios,
tua gente heroica
vive empedernida
nesta lida exótica
pelas avenidas.


São Paulo,
do centro expandido.
São Paulo,
mundos divididos.
São Paulo,
Itaquera e Mooca.
São Paulo,
saudosa maloca.
São Paulo,
quero o teu divã.
São Paulo,
Ira de Titãs.
São Paulo,
vou ficar aqui.
São Paulo,
cadê Rita Lee?


Velha espaçonave
nada dirigível
teu desterro grave
é teu combustível,
os teus nordestinos,
teus italianos
sofrem desatinos
nos teus desencantos.
Os teus japoneses,
os teus libaneses
e outros povos mais
no teu solo em paz,
vida que não pára,
todo dia igual,
o tempo ultrapassa
o teu carnaval.
Midas hipotético
de existência crônica,
sussurro profético
da orquestra sinfônica.
Natureza insólita
de sangue e suor,
tua paz hipócrita
será bem melhor.


São Paulo...  São Paulo...  São Paulo...


Vivo São Paulo.
Amo São Paulo.
Saúdo São Paulo.




(In: O Perfume do Tempo - 2004/2005)

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

ODE À DEUSA DA VOZ (Elis Regina)


Eu tinha apenas nove anos
quando soube que partiste,
já são tantos os enganos
que hoje sei o quanto existes
nas músicas que ficaram
como se em placas de pedra,
que ninguém mais interpreta,
pois as vozes se calaram
abafadas pela tua
voz marcante, quase crua,
sentimento à flor da pele
da mulher que nada deve
às deusas das várias épocas
da música mundial,
comoventes flores bélicas
de existência visceral.



No teu sorriso gostoso
havia um falso brilhante
de uma tristeza gritante
tal qual vulcão em repouso.
És uma estrela no céu,
nos palcos da eternidade,
um barquinho de papel
que as águas todas invadem.



Chegaste ao fim do caminho
e cedo demais deixaste
todos nós sem teu carinho
e a alegria que guardaste.
Elis, só agora te entendo,
depois destes longos anos,
cada vez mais me envolvendo
com os teus doces encantos,
que foste embora depressa
levando os sonhos que vagam,
porque todo show começa
pelas luzes que se apagam.

(In: O Perfume do Tempo - 2004/2005)